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Princesa

domingo, 2 de outubro de 2011

500 - 100 - 10 - A Lição de Xanana

Foi na Aula Magna da Reitoria que Xanana se reencontrou com os seus compatriotas residentes em Portugal. E com os amigos de cá, que são muitos.


Foi apresentado um projecto global de desenvolvimento para todo o território timorense, pairando no ar a sensação de se estar a testemunhar algo de muito invulgar: a construção de um país a partir do quase nada…

E de se estar perante um Povo que, devagar devagarinho, mas bem, constrói o seu futuro, saboreando ao mesmo tempo a sua paz sagrada, como gostam sempre de realçar.


Pedra a pedra, degrau a degrau, assim evoluem. E é impressionante a forma como o fazem. Com serenidade, com planeamento e, quem diria, com dinheiro.



E Xanana falou. Uma hora!

E todos o ouviram num silêncio contador de moscas.

Com o seu característico tom de voz, arrastada, mas firme e convicta. A um dado momento, disparou:

…No próximo ano, comemoraremos em Timor, os 500 anos da entrada dos portugueses.


Esses mercadores aventureiros que por lá aparecerem. Esses mal vestidos e dominadores que nos encontraram quase nus perdidos naquelas montanhas sem fim…

E Xanana, que mais parecia brincar, abordava de uma forma séria e muito diferente da que estamos habituadas, a questão da nossa histórica presença colonialista. E dirigiu-se aos amigos portugueses:

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Não pensem, - dizia - que a coisa foi fácil, porque tudo fizemos para correr convosco… ora andávamos amigos, ora tínhamos revoltas e zangas por causa dos abusos de alguns dos colonos… e a maior de todas, contra a vossa presença, ocorreu precisamente em 1912. Foi a revolta de Manufai que provocou a morte a milhares de timorenses.


Para o ano comemoraremos os 100 anos dessa luta pela libertação.

Graças ao apoio de muitos – continuava – e, em particular dos nossos irmãos portugueses, fomos heróis e combatemos a ocupação indonésia. E conseguimos! Com mortes, dramas, sangue, suor e muitas lágrimas, mas conseguimos! Por isso, hoje somos independentes.


Em 2012, comemoraremos 10 anos de independência. E sorria, dizendo, só 10 anos?!


Mas independentes!

Ou seja, no próximo ano faremos três comemorações: os 500 anos da vossa chegada, os 100 anos da nossa revolta e os 10 da independência.


Xanana, de forma inteligente, comemora a história, assumindo-a. Valoriza a presença portuguesa, sem esquecer as ofensas ao povo maubere, marcada de forma dramática com a trágica revolta de Manufai.


Mas é graças à presença portuguesa que hoje somos independentes. Estamos inseridos num universo territorial de 17 000 ilhas, e só metade da nossa é independente. Sabem porquê?


E Xanana explica.


- Há uns meses, em Díli, numa reunião onde participei, um velho indonésio, volta e meia, batia com o punho na mesa e exclamava zangado: Portugal!

E repetiu a cena várias vezes, acabando sempre com a expressão mal-humorada, Portugal! Portugal! o que me obrigou a perguntar-lhe: oh homem, diga-me lá o que tem contra Portugal, para estar para aí tão zangado?

O que tenho? - respondeu o velho, - é muito simples. Se os portugueses não tivessem abandonado as Flores, hoje também seríamos independentes, como Timor. Quer que eu esteja satisfeito?


Eis como, se não fossem os portugueses, hoje não seríamos independentes, rematou Kay Rala Xanana Gusmão, o Moisés de Timor, como o assumiu D. Basílio do Nascimento.


E foi num ambiente de esperança e sincera amizade que mais uma vez reencontrei e abracei este amigo, que em tempos me confiou um dos elementos mais importantes da sua Lulik (Casa Sagrada)


António Rodrigues

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